Oscar acende discussão sobre gênero

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Após anos de críticas sobre a “predominância branca e cisgênero” na cerimônia do Oscar, este ano o destaque foi para a presença de mulheres, trans, negros e imigrantes. O próprio discurso do apresentador Jimmy Kimmel durante a noite – e de vários artistas que entregaram e receberam prêmios – conteve várias alfinetadas e referências sobre as questões. Kimmel inclusive explicou as mudanças, colocando o espetáculo como uma vitrine para a sociedade: “o mundo está nos observando e precisamos ser um exemplo”, disse.

Em 90 anos de cerimônia de premiação, esta foi a primeira vez que um filme estrelado por um transgênero venceu uma das principais categorias do Oscar. “Uma mulher fantástica”, que tem como protagonista a cantora e atriz transexual chilena Daniela Vega, conquistou o prêmio de Melhor Filme Estrangeiro, no último domingo. Na história do Oscar, outros filmes com personagens transgêneros já haviam sido premiados, porém, com atores cisgênero (pessoas com identidade de género e sexo biológico coincidentes). Além de “Uma mulher fantástica”, um dos indicados a melhor documentário, “Strong Island”, também foi um destaque na questão de representatividade trans na premiação. A produção, que aborda o racismo e as falhas no sistema judiciário, foi dirigida e escrita por Yance Ford, cineasta transexual que inclusive participou de uma das montagens exibidas durante a cerimônia.

Assunto é tema de debate entre classe médica

Levantamento do Ministério da Saúde aponta que, em 2016, o SUS atendeu 4.467 pessoas interessadas em passar pelo processo transexualizador, um aumento de 32% em relação ao ano anterior. No Paraná, o Simpósio de Atualização em Endocrinologia, promovido pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia Regional Paraná (SBEM-PR), debateu a conduta na disforia de gênero no último final de semana, em Londrina. O psiquiatra da Santa Casa de Misericórdia de Curitiba e membro do Grupo Paranaense de Sexualidade, GPSEX, Dr. Eduardo Medici, falou sobre orientação sexual, identidade sexual e disforia de gênero.

De acordo com o médico, identidade de gênero é uma questão interna, pessoal e individual. “Ninguém aprende a ter uma identidade, a pessoa simplesmente sente como ela se percebe”, comenta Medici. Para o médico, o termo “transgênero” é um guarda-chuva que engloba pessoas que não se identificam com o gênero atribuído ao nascimento, que consta no registro de identidade. Elas podem se identificar com o gênero oposto, com o mesmo gênero ou com nenhum dos dois. “Dentro desse guarda-chuva está o transsexual, que é o indivíduo que busca uma transição social do masculino para o feminino (ou vice-versa) e que, em muitos casos, busca intervenções para se adequar ou se aproximar do gênero que ele se sente pertencente, seja por meio de tratamento hormonal, vestimentas ou até cirurgia de redesignação. Mas fazer cirurgia não significa que os problemas serão resolvidos”, alerta.

Um estudo realizado em 2015 pelo Centro Nacional pela Igualdade de Transgêneros revelou que 40% das pessoas que se identificam como transgêneros tentaram suicídio – índice quatro vezes maior se comparado com o restante da população. A professora livre-docente da Faculdade de Medicina da USP, coordenadora do programa de capacitação de profissionais para o tratamento de transsexuais, Dra. Elaine Frade Costa, e o endocrinologista membro do GPSEX que atuou no Centro de Pesquisa e Atendimento à Transsexuais e Travestis na Secretaria de Saúde do Paraná, Dr. Emerson Cestari Marino, ressaltaram a importância de um tratamento multidisciplinar. “Quando o tratamento é periódico e envolve toda uma equipe médica, o trans sente a preocupação e todo o cuidado do médico com eles, há uma queda no índice de suicídio. Por isso na importância de se consultar com psicólogos que ajudem na transição, aceitação e que preparem a pessoa para as mudanças e todo o preconceito que podem ser sofrido”, comenta Elaine.

Segundo artigo publicado na revista The Lancet, os riscos de suicídio nesta população estão diretamente relacionado à violência e discriminação. Para a presidente da SBEM-PR, Dra. Silmara Aparecida Oliveira Leite, o principal passo para essas questões é acabar com o preconceito. “Precisamos mudar o julgamento da sociedade sobre as pessoas que não se identificam com o gênero de nascimento por não se tratar de escolha e para evitar a violência sofrida por estas pessoas – em especial por parte de familiares”, disse Silmara.

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