De acordo com a lei federal nº 12.933, pessoas com deficiência têm o direito ao pagamento de meia-entrada em espetáculos artístico-culturais e esportivos. O mesmo benefício é concedido a estudantes, idosos e jovens carentes. Com este pensamento, Eduardo Patrício da Silva, com deficiência nas duas pernas desde os oito meses de vida, decorrente de uma paralisia infantil, tentou assistir à partida entre América-RN e Boavista, pela Copa do Brasil, na última semana. Seria a primeira vez na vida que o estudante iria a um estádio de futebol. No entanto, ele foi impedido de comprar um ingresso com desconto na bilheteria da Arena das Dunas, em Natal.
– Na hora eu fiquei muito triste, bem chateado. Fui para casa bastante frustrado com o que aconteceu. Eu nunca fui a um jogo de futebol e estava ansioso pela primeira vez. Cheguei até a levar a lei com o parágrafo que garantia meus direitos destacado, mas não teve jeito – lamenta o estudante.
Além de assistir ao jogo do time do coração, o objetivo do torcedor alvi rubro era medir o grau de dificuldade sentido por um deficiente físico no trajeto até ao estádio que receberá os jogos da Copa do Mundo na capital potiguar. Hoje, com 37 anos, Eduardo anda com o auxílio de muletas e exoesqueleto (com cinta pélvica e botas ortopédicas). Ele integra o projeto “Esporte, Sociedade e Políticas Públicas”, orientado pelo professor Fábio Fonseca, do departamento de políticas públicas da UFRN.
– Eu lhe disse que havia um cartaz na bilheteria que indicava que cadeirante tem direito de pagar meia-entrada. A senhora nos informou que cadeirante sim, de muletas não – lembra o professor.
Segundo ele, uma funcionária do estádio teria negado o direito da meia-entrada alegando que não estava autorizada a cumprir a lei, por determinação da administração da praça esportiva. Em outro momento, a mesma funcionária teria justificado a negativa afirmando tratar-se de um evento privado.
De acordo com a referida lei federal, cabe a produtora do evento disponibilizar “o número total de ingressos e o número de ingressos disponíveis aos usuários da meia-entrada, em todos os pontos de venda de ingressos, de forma visível e clara”, na forma da lei. Quando for o caso, a produtora deve ainda avisar “que houve o esgotamento dos ingressos disponíveis aos usuários da meia-entrada em pontos de venda de ingressos”.
Mesmo no canal de vendas online, não está previsto o desconto para cadeirantes ou mesmo para pessoas com mobilidade reduzida. Essas categorias aparecem no site oficial da Arena das Dunas apenas com valor de inteira, embora o cadeirante tenha direito a um acompanhante de forma gratuita – o que totalizaria o mesmo custo de duas meias-entradas. O site enquadra como meia-entrada somente idoso, estudante, menor, professor e doador de sangue.
Após o ocorrido, Eduardo enviou um e-mail para o setor de comunicação da arena relatando o ocorrido e pedindo explicações oficiais. De acordo com ele, a resposta foi taxativa em dizer que “a lei não tinha validade pois ainda não foi decretada pela presidente”. Porém, a lei foi decretada pelo Congresso Nacional e sancionada pela presidente Dilma Roussef no dia 26 de dezembro de 2013.
Diante de toda a frustração, Eduardo garante que agora é hora de pensar em todas as pessoas com deficiência que podem vir a passar por problemas semelhantes. Ele admite ainda que acionará a justiça
– Meu objetivo agora é garantir que as pessoas com deficiência tenham o direito assegurado desde já na Arena das Dunas e que elas possam usar esse direito que eu não tive. Meu objetivo é lutar pela classe. Além disso, pretendo acionar a justiça e dar entrada a um processo indenizatório contra a arena – garante Eduardo.
Em nota, a Arena das Dunas explica a postura adotada no episódio e afirma o seguinte: “Desde sua concepção, a Arena das Dunas se preocupa com acessibilidade, mobilidade e responsabilidade social, corporativa e ambiental. Os Portadores de Necessidades Especiais (PNE) têm direitos previstos em lei que são respeitados em todos os eventos. A Lei nº 12.933/2013 que foi publicada em dezembro ainda será regulamentada. Assim, a Arena das Dunas gostaria de esclarecer que esta ainda não é aplicada.
Por outro lado, de acordo com a presidente da Comissão dos Direitos da Pessoa com Deficiência da OAB-RN, Elyane Vieira de Castro, a lei federal está em vigor e deve ser cumprida. Segundo ela, o que existe é uma falta de regulamentação de qual documento deveria ser apresentado para comprovar a deficiência, o que não impede o cumprimento da norma, já que alguns tribunais foram favoráveis às pessoas com deficiência que passaram por situação parecida. A OAB afirma ainda que a lei deve ser cumprida em todos os estabelecimentos, sejam eles públicos ou privados.